1.
O garoto acordou com os olhos
inchados, pois havia ficado até tarde jogando rpg no computador. Era dia de
prova, e por esse motivo, ele não havia estudado direito. Pelo fato de não se
importar muito com os estudos, não estava indo muito bem na escola, por que
preferia ficar no quarto jogando a ter vida social. Sua mãe já havia o avisado
que se ele não passasse, ele não teria sua viagem de fim de ano, para ver seus amigos do estado vizinho, cujos
pais foram transferidos por causa do exército. Depois desse evento, em que seus
únicos amigos foram arrancados dele, ele começou a se isolar das pessoas a cada
dia. Mas com o tempo ele passou a não se importar muito de não ir visitar os
amigos. Estava virando um hikikomori aos poucos, só saía de casa para ir à
escola, e mesmo assim, tinha vezes que, ao invés de seguir caminho para lá, matava
aula e ia para uma praça abandonada para... Jogar. Por esse e outros motivos,
não tinha quase amigos nenhum, a não ser o Zack, que era visto como marginal em
qualquer lugar que fosse.
Levantou-se da cama, cambaleando, e
foi ao banheiro para lavar o rosto. Ao olhar seu reflexo no espelho, viu que
seu rosto estava abatido, com profundas olheiras.
- Tch. Tenho q parar de jogar né. Só
que não. – pensou ele.
Depois de tomar banho e vestir o
uniforme, porcamente, tomou café quase caindo da mesa, de sono, e saiu correndo
pro ponto de ônibus, que não era muito longe de sua casa. A cidade estava
vazia, era fim de ano, a maioria dos vizinhos e moradores já tinham ido viajar,
e só os mais idosos permaneceram em suas casas. Não havia mais aquele movimento
intenso de pessoas indo e vindo pra trabalhar, estudar e etc.
- Merda. Todo mundo em casa
descansando e eu tenho que ir pra escola -q - disse o garoto, que se chamava
Kazuki Meihiro.
Ao chegar ao ponto de ônibus onde
pegaria o escolar, avistou uma garota de vestido azul marinho e olhar
observador, andando cautelosamente pela rua. A menina parecia ser turista, pois
andava pelo passeio de um jeito muito peculiar, e toda hora levava a mão
direita à frente do rosto e tampava um dos olhos.
Logo Kazuki percebeu que havia algo
errado com ela, pois ficava o tempo todo olhando para os lados, e para ele,
inquietamente. Apesar de ele ser anti social, tinha uma percepção anormal para
as coisas e era muito observador – foi o que salvou ele várias vezes de grandes
infortúnios na escola durante o ano.
Logo o ônibus passou, e Kazuki deu
sinal, e foi pra escola.
Ao chegar, percebeu que esta estava
melancolicamente vazia, pois a maioria dos alunos já estava de férias.
- Kaaaaaaaaaazuuuuuuuuuukiiiiiiiiiiii!
- ouviu se ao longe um grito rouco.
E se aproximou um garoto alto de
cabelos brancos, um pequeno brinco na orelha, óculos de descanso, cintos
pesados e longas botas.
- Vish. Bom dia Zack. Ficou para
recuperação também? - disse Kazuki.
- Pois é cara, não deu. Mesmo eu me
esforçando bastante não consegui passar em algumas matérias...
- Ah cole, você nunca se esforça. Só
fica mechendo em seus projetos e lendo revistas de tecnologia no horário de
aulas. Não vai passar mesmo.
- Ahhhh olha quem fala, Sr. Gamer. Pelo
menos eu faço algo útil.
- Hum. Que seja. Algo novo pra
contar?
- Tenho sim, MANO VOCÊ NÃO SABE O
QUE EU CONSEGUI ONTEM!
- É, não sei mesmo.
- Sabe aquele módulo que eu estava
trabalhando nele a um tempão?
- Hm.
- Eu consegui, eu inventei um
mecanismo de ação e reação pra ele, agora o meu H.i.r.o vai conversar com a
gente melhor do que antes CARA!
- Ham.
- O que foi? Parece que não gostou...
- Na verdade, eu nao entendi merda
alguma com merda nenhuma.
- Ah normal... Deixa pra lá.
Zack, apesar de ser considerado um
marginal pela sua aparência, era um gênio em física e mecânica, e seu hobby era
construir robôs horríveis, mas com altos índices de interatividade. Ele havia
ficado para recuperação pelo fato de largar os estudos para trabalhar em suas
invenções, por isso estava na mesma situação do seu amigo.
- Quais matérias você perdeu esse
ano? - perguntou Kazuki, fingindo interesse.
- Ah sim, perdi história e
geografia, biologia e redação...
- As mais difíceis você conseguiu
passar...
- Mas é claro, eu sou um gênio da
física HOHO.
- Uhum... E porque não trabalha pro
governo com sua genialidade?
- Você é louco? Não posso
compartilhar meu conhecimento puro com essas pessoas que só estão preocupadas
com dinheiro - disse Zack, cheio de si.
- Pfff, ta certo então, olha, são 8
horas, vou entrar pra sala, até mais. - despediu-se Kazuki.
- Certo, mais tarde passa lá em casa
pra ver o meu H.i.r.o.
- O seu o que...?
- H.i.r.o, minha nova invenção -
respondeu-lhe Zack, com os olhos brilhando.
- Ah, vou pensar, tenho encontro
marcado com os caras do Digimon online.
- Ah nao acredito nisso, você vai
trocar seu amigo por um jogo?
- Vai começar com o drama?
- Ah que seja, vai se quiser. Fui. -
disse Zack, contrariado.
- Até mais - sorriu Kazuki.
Eles eram amigos desde pequenos,
quando a família Meihiro se mudou para Ikebukuro, por não achar um lugar mais
barato pra comprar uma casa boa e espaçosa, e logo que entrou no colegial,
Kazuki conheceu o Zack, numa briga, que, aliás, o segundo teve que ajudar o
primeiro a se safar dos caras. Não que Kazuki fosse covarde, ele apenas não
daria conta de 5 caras ao mesmo tempo.
Kazuki entrou na sala de aula onde
iria fazer as ultimas provas do ano, torcendo para que conseguisse passar, e
ficar livre daquele ambiente cheio de pessoas.
- Kazuki Meihiro? Está atrasado até
pro evento que vai decidir se ficaremos juntos novamente no próximo ano? -
disse uma garota ruiva de saia curta - a vadia da classe.
- Nao enche Lily, só vim fazer essa
maldita prova e voltar pra casa.
- Voltar pra casa? Ou voltar pra sua
realidade virtual, jogando aquelas coisas estranhas no computador?
- Nao te devo satisfações, onde está
o sensei?
- Hum, que grosso. Yukimura-sensei
está na sala ao lado, espere só um minut... - foi interrompida com o barulho da
porta se fechando - Kazuki ja havia saído.
- Érr... - disse a garota.
- Yukimura-sensei. Desculpe o
atraso. Vim fazer a recuperação. - disse Kazuki.
O professor olhou por cima dos
óculos velhos para Kazuki, e largou os papéis que estava mexendo em cima da
mesa e levantando-se, disse:
- Hã, só vou te avisar uma coisa. É
melhor que tire uma nota bem grande, senão irei lhe reprovar por faltas, e sua
mãe ficará sabendo disso.
- Nao se preocupe, estou preparado.
- blefou o garoto.
O Yukimura olhou para Kazuki com
olhar de desdém.
- É o que veremos. Sente-se aí logo.
Estou com pressa de sair de férias.
“Estou com pressa de sair de férias,
professor maldito.” Aposto que fez a prova mais difícil pra mim, só pra me reprovar.
– Pensou o garoto, fazendo uma careta.
Kazuki sentou-se e começou a ler a
prova de matemática, e se perdendo em pensamentos, tentou resolver aquelas
coisas complicadas – algumas ele nunca havia ouvido falar.
Enquanto isso, do lado de fora da
escola, uma garota de vestido azul passava os olhos de forma cuidadosa em cada
canto da escola, por trás de uma lente especial, que deixava sua pupila
levemente avermelhada.
Trinta minutos depois, ele já havia
entregado os pontos e jogado a prova na mesa do professor e saído da sala pisando
duro e torcendo para que a Lily não o visse. Estava caminhando pelos corredores
da biblioteca, esperando o seu amigo Zack sair de sua sala, quando o telefone
começa a tocar.
- Sim, mãe...?
- Kazuki, como foi na prova?
- Sei lá. – disse Kazuki, passando a
mão na cabeça, distraído.
- Sem essa, seu professor ligou pra
cá agora mesmo.
- Sério? O que ele queria?
- Pasme, ele queria que eu te
levasse num psicólogo.
- Hã.
- "Hã" nada. O que você
anda aprontando na escola ein, mocinho?
- Eu nada.
- Tem certeza? Não é o que parece.
- O que o sensei te disse, mãe?
- Já lhe digo. PRIMEIRO ME DIGA O
QUE ANDA APRONTANDO, GAROTO!
- Mãe...
- Vamos, ele não ia me ligar assim
atoa.
- Mãe, se eu tivesse mesmo agindo
estranho, você perceberia, não?
- ...
- Ein. Você com certeza saberia. Me conhece
melhor que qualquer um, certo?
- Até que faz sentido.
- Então me diga que ele está
equivocado.
- Como tem tanta certeza? Você vai
pra escola eu não sei o que você faz lá.
Pode ser que você seja alguém diferente do que é em casa, não acha?
- Puxa, me chamou de duas caras.
- Não é isso meu filho. Apenas ele
não ia me ligar atoa, é o que eu acho...
- Ah. A senhora sabe que o yukimura
não gosta de mim ...
- Ainda acho que isso é cisma sua,
Kazuki.
- Enfim. Me diga o que ele te disse.
- Adivinha...
- Como assim?
- Começa com V e tem cinco palavras.
- Aff...
- Você gosta de puzzles, não?
- Você não entende nada de jogos,
mãe... Por favor, o que ele disse?
- Hum... Tenta adivinhar com a dica
que te dei.
- Não faço idéia...
- Vou dizer então.
- Isso!
- Você Não Passou De Ano. Agora
volta pra casa, está de castigo, sem videogames e computador.
Ainda com raiva do que a mãe
lhe disse, Kazuki sai do corredor da escola socando as paredes.
- Não acredito nisso. Pensei que era
só a viagem que ela iria cancelar. Não é justo.
- O que houve, Kazuki-kun? - Zack
aparece na porta de uma das salas.
- Minha mãe acabou com minha
diversão...
- Você não passou de ano né?
- Nao... Acho que vou é pra sua casa.
- Sério? Cara... É incrível como sou
sua segunda opção.
- E é incrível como você é
dramático. Se não quiser não vou.
- Se você não for pra minha casa,
pra onde irá ou o que irá fazer?
- tch.
- Você não tem escolha, hehe.
- Já entendi. Ou é ir pra sua casa,
ou é morrer de tédio...
- Você é esperto... Te vejo às 18?
- É, pode ser...
- Até lá então - Sorriu Zack, e deu
um tapa na cabeça de Kazuki, se despedindo.
E cada um foi pro seu lado. Kazuki
estava com fome, então resolveu passar numa lanchonete e comprar algo para
comer. Ao entrar na primeira loja que viu, comprou um pote de takoyaki e se
sentou numa mesa que dava vista para fora, mostrando claramente a rua à sua
frente. Foi quando Kazuki viu algo incomum. Nas ruas vazias de Ikebukuro,
via-se um vulto correndo pelas sombras, e ele se sentia observado. Ou talvez
fosse apenas a sua imaginação. Kazuki pagou o lanche e saiu da loja, que,
aliás, era bem perto de sua casa. Foi caminhando vagarosamente por ali,
observando cada metro quadrado. "Talvez tenha sido mesmo minha imaginação.
Vou pra casa tomar um banho", pensou.
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